sábado, 12 de dezembro de 2009

Michael O'Leary: "Adoramos uma recessão"



A recessão tem sido boa para a Ryanair Holdings Ltd.

Graças a suas tarifas baixas, a companhia irlandesa transportou mais passageiros internacionais do que qualquer outra aérea do mundo no ano passado. Ela deve continuar crescendo e divulgar lucros sólidos novamente este ano, enquanto concorrentes mais tradicionais lutam com a falta de passageiros e descontos nas passagens, apesar dos primeiros sinais de recuperação do mercado.

Há uns dez anos, o ambicioso diretor-presidente da Ryanair, Michael O'Leary, levou à Europa o modelo de simplicidade e frugalidade da americana Southwest Airlines Co. Ele vitaminou o plano de negócios da empresa com cortes de custos e passagens baratas. Listada na Nasdaq, a Ryanair tem sido uma das companhias aéreas mais consistentemente lucrativas da década.

Em 2001, a Ryanair se tornou a primeira nova companhia aérea da Europa a eclipsar uma concorrente estatal, quando ultrapassou a empresa nacional da Irlanda, a Aer Lingus. Desde então, ela tentou duas vezes comprar a rival e agora conta com 29% do capital dela.

O'Leary, que personifica o velho estilo hollywoodiano do falem mal, mas falem de mim, é tema frequente nas manchetes dos jornais com seus insultos a autoridades de regulamentação, concorrentes e fornecedores. Diferentemente de outros executivos do setor aéreo — que tentam recuperar o velho glamour das viagens de avião —, O'Leary compara a experiência de voar com a de andar de ônibus.

Depois de participar de um evento recente na sede da União Europeia, em Bruxelas, em que desprezou os planos da UE para a infraestrutura aérea como "nada mais que lixo", O'Leary conversou com o Wall Street Journal sobre o que chama de ideias "malucas" que estuda, como cobrar pelo uso dos banheiros no avião e oferecer vagas em pé. Trechos:

WSJ: Como a recessão afetou a Ryanair, e como o sr. a aproveitou?

Michael O'Leary: Adoramos uma recessão. Baixamos as passagens, baixamos os custos e expandimos a empresa mais 15% — e empurramos mais alguns concorrentes ladeira abaixo.

WSJ: Seus custos já são bem baixos. Existe um ponto em que fica difícil continuar cortando?

O'Leary: Realmente você chega a um ponto, mas provavelmente estamos a uns 20 anos dele. O que você tem que fazer é ser mais revolucionário.

Este ano, graças ao dólar em baixa, teremos custos menores com aviões e manutenção. Estamos baixando os custos com aeroporto, e congelamos os salários para diminuir os custos com folha de pagamento.

Agora temos de ser mais criativos na maneira como cortamos custos, e é por isso que estamos de olho em coisas que parecem revolucionárias para outras pessoas.

Tipo, pagar para despachar as malas: não é para conseguir receita. É para convencer as pessoas a mudar seus hábitos de viagem — viajar só com a bagagem de mão. Mas isso permitiu que passássemos ao check-in 100% na internet. Então não precisamos mais de balcões. Não precisamos mais de funcionários para os balcões. Os passageiros amam isso porque nunca mais ficam presos numa fila de check-in da Ryanair. Isso nos ajuda a baixar significativamente os custos com aeroporto e despacho de bagagens.

Agora estamos pensando em cobrar pelos banheiros de bordo — não por querermos ganhar receita com os sanitários. Adoraríamos doar esse dinheiro para alguma instituição de caridade dos incontinentes. O que isso significa é que, se cobrarmos pelos banheiros de bordo, mais pessoas vão usar os banheiros dos terminais antes ou depois dos voos, e talvez eu possa tirar dois dos três banheiros de bordo, acrescenar mais seis assentos e reduzir o preço das passagens em mais 3 ou 4%.

Então, sempre existem novas maneiras de baixar custos, mas você tem que abordar o problema com alguma imaginação e paixão.

WSJ: É difícil incentivar a criatividade, especialmente quando o salário está congelado?

O'Leary: Temos uma equipe jovem muito brilhante. Acho que eles entenderam o contexto congelamento. Na Irlanda, houve deflação de uns 5%, então eles ainda estão ganhando, mesmo sem aumento de salário. O que tentamos evitar é corte de salário ou corte de emprego. Acho que eles apreciam isso.

Mas acho que o desafio de bolar novas ideias sempre é interno. É por isso que tentamos incentivar a geração de ideias internamente. Fazemos isso com uma cultura aberta e entusiasmada que incentiva as pessoas a gerar ideias loucas, quanto mais maluca melhor.

Outra ideia que estamos estudando é tirar as últimas dez filas de assentos e colocar corrimões. Nesse caso, poderíamos oferecer em cada voo, deixa eu ver, uns 125 assentos. Mas você também teria espaço em pé para mais 100 passageiros. E a proposta é que se você quer um assento, paga 30 euros (US$ 44). Mas se está disposto a ficar em pé, paga 1 euro.

WSJ: O que não deu certo para o sr. no último ano?

O'Leary: Nossa campanha para quebrar o monopólio do Aeroporto de Dublin claramente não funcionou ainda.

Nossa oferta para comprar a Aer Lingus e expandi-la rapidamente ainda não deu certo, e é por isso que a Aer Lingus está dando prejuízo recorde e anunciou mais uma rodada de 800 demissões.

O fato de que o governo irlandês (dono de 24% da Aer Lingus) já nos rejeitou duas vezes mostra como o governo irlandês é estúpido. Poderíamos ser mais legais com o governo irlandês. Mas acho que como eles são casados com os sindicatos da Aer Lingus, nossas ofertas estavam destinadas ao fracasso desde o início. Então acho muito improvável que façamos uma terceira oferta.

WSJ: Algumas das ideias do sr. para economizar, como cobrar pelas refeições e para despachar as malas, já pareceram chocantes, mas agora são o padrão. Qual foi a dificuldade de conseguir que as pessoas mudassem suas expectativas sobre o que estavam pagando?

O'Leary: Acho que é incrivelmente fácil se você é aberto e franco com os passageiros. Somos abertos sobre nossas políticas: você não vai ganhar comida de graça. Não queremos que você despache as malas. Não vamos arranjar um hotel para você porque a vovó morreu.

Mas eles entendem que, em compensação, garantimos as tarifas mais baixas da Europa, de longe. E vamos garantir o menor número de atrasos, cancelamentos e bagagens perdidas.

E é isso que as pessoas realmente querem, transporte aéreo seguro e barato de A para B. É uma commodity. Não é uma experiência sexual transformadora, que é o que as companhias aéreas mais caras tentam te convencer.

WSJ: O sr. tem declarado publicamente a sua frustração com o ritmo das negociações com a Boeing para um grande pedido, que já duram um ano. Como estão as coisas?

O'Leary: Efetivamente fechamos um acordo para o preço de 200 aviões. Mas as negociações pararam porque a Boeing quer voltar atrás e mudar as condições de entrega. São coisas como garantia e metas de desempenho. Mas não vamos aceitar condições de entrega inferiores às de nossos atuais pedidos.

Nossa última reunião do conselho no ano ocorre hoje em Dublin. Não vejo como recuperar esse acordo até lá. É pouco provável que o acordo aconteça.

WSJ: Qual é o plano de reserva?

O'Leary: Não pedimos mais aviões até 2013. Ainda temos quase 100 aviões para receber até 2012. Ou voltamos para a Airbus ou para a Boeing na próxima crise. Ou paramos de crescer a partir de 2013, e começamos a devolver dinheiro aos acionistas. (Um porta-voz da Boeing não quis comentar as negociações.)

Fonte: Daniel Michaels - The Wall Street Journal.
Photo by: Ryanair/Boeing/Google Image.

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